Desde que o primeiro ser humano bateu duas pedras e percebeu que o som tinha ritmo, a música acompanha nossa jornada como espécie. E não é exagero dizer que ela molda emoções, conecta pessoas e, muitas vezes, salva vidas. A ciência confirma: ouvir ou fazer música pode reduzir sintomas de ansiedade, melhorar o humor e até ajudar na reabilitação neurológica.
A música tem o poder de curar onde palavras falham. Ela já foi usada em rituais, celebrações, batalhas e, hoje, em contextos clínicos. Considerada terapia em diversos cenários, desde grupos de apoio até tratamentos neurológicos, conecta emoções, ativa memórias e até modula a atividade cerebral. No universo pop, esse papel foi eternizado por figuras como o bardo dos RPGs, que inspira e cura sua equipe, ou pelo Star-Lord, cujo walkman é tão poderoso emocionalmente quanto qualquer arma. A primeira temporada de The Witcher na Netflix pode ter muitas falhas, mas o bardo ganhou destaque com sua canção sobre o bruxo!
Bem, quanto ao uso da música, eu mesmo já recorri a ela em momentos difíceis, momentos de relaxamento, momentos de confraternização e até em momentos de estudo. Alguns ritmos me ajudavam a estudar matemática de maneira mais focada.
Quem nunca colocou uma faixa específica para se recompor depois de um dia pesado ou depois de um alívio enorme por algo que conseguiu? A gente não precisa ser cientista para perceber que música mexe com a mente de um jeito único. Mas a ciência mostra que ela vai além da inspiração: pode ser uma ferramenta concreta em condições neurológicas, como a epilepsia.
Mozart K.448: sinfonia terapêutica para crises epilépticas
Estudos clínicos mostraram que ouvir Mozart, Sonata para Dois Pianos em Ré Maior, K.448 reduz significativamente a frequência de crises em pessoas com epilepsia, especialmente nos casos resistentes a medicamentos.
Em um estudo randomizado com adultos, ouvir diariamente os seis primeiros minutos dessa sonata durante três meses resultou em diminuição das crises, ao contrário de uma versão musical embaralhada usada como controle, sem ritmo reconhecível.
Além disso, neurocientistas identificaram que essa sonata reduz atividades cerebrais anormais chamadas descargas epileptiformes, especialmente em regiões frontais ligadas à emoção, após apenas 30 segundos de exposição.
A explicação ainda está sob investigação, mas a hipótese é que essa música tem uma estrutura rítmica fluida e menos previsível, que acaba ressoando com o cérebro e o afastando de padrões que levam às crises.
Música personalizada: indo além de Mozart
Pesquisas mais recentes exploram repertórios personalizados, ajustados ao perfil elétrico cerebral de cada paciente. Isso abre espaço para pensar numa espécie de trilha sonora individual, capaz de modular o cérebro de forma benéfica.
É como se cada um tivesse sua própria “playlist terapêutica”, criada sob medida para restaurar o equilíbrio mental. Confesso que acho fascinante imaginar um futuro em que a prescrição médica possa incluir algo como: “ouvir a faixa X, três vezes ao dia”.
O perigo do “modo bardo” invertido: musicogenic epilepsy
Nem toda música cura. Existe um quadro raro chamado epilepsia musicogênica, em que certos sons ou melodias, fortemente ligados a memórias emocionais, podem disparar crises.
Para quem quiser se aprofundar nesse tema, recomendo o livro Alucinações Musicais, de Oliver Sacks. O autor aborda casos incríveis que mostram como a música pode tanto curar quanto desencadear sintomas neurológicos. É leitura obrigatória para quem se interessa pela intersecção entre som, cérebro e comportamento. Eu já li umas três vezes e de vez em quando ainda dou uma folheada.

O bardo moderno e a cura sônica
Na cultura pop, personagens como o bardo de Dungeons & Dragons usam música para inspirar e curar. Na vida real, a musicoterapia assume esse papel em hospitais, centros de reabilitação e consultórios.
Músicas como Imagine de John Lennon, Fix You do Coldplay ou Here Comes the Sun dos Beatles são usadas em contextos de ansiedade, luto e autoestima. Já em quadros neurológicos mais específicos, como a epilepsia, a ciência aponta para composições com estrutura rítmica especial, como a de Mozart.
Checkpoint final
A música atravessa eras, culturas e cérebros. Pode acalmar um coração acelerado, ajudar a processar emoções e até modular tempestades elétricas no cérebro. Desde os bardos medievais até os cientistas que estudam sinfonias como terapia, ela se mantém como uma das ferramentas mais poderosas que temos para cuidar da mente.
Mas é bom lembrar: música como tratamento exige critério e acompanhamento profissional. A trilha sonora interna é poderosa e, quando guiada da forma certa, pode ser um caminho para cura, resiliência e conexão.

José Maria Santiago, médico psiquiatra e professor de medicina, é um explorador da mente humana e um aficionado por cultura pop. Entre aulas e consultas, também encontra tempo para debater filmes, séries e games no seu podcast, o Encontroverso, onde o cérebro e o entretenimento se encontram. Especialista em fazer a ciência caber numa conversa de café e em emitir opiniões baseadas em certezas que não tem, acredita que o equilíbrio está entre a compreensão profunda da psique e uma maratona de filmes ruins bem escolhida!