Aprendemos, com os antigos filmes de “faroeste”, uma forma eficiente de mandar mensagens: uma fogueira, um cobertor e uma codificação específica e “voilà”. Não ia tão longe e nem continha tanta informação quanto um post nas redes sociais de hoje, mas era perfeita para avisar sobre perigos iminentes, ainda que o próprio inimigo pudesse “ler” a mensagem (mas não entender ou entender errado).
Nas últimas semanas estamos tendo dois desses sinais e a maior preocupação, num país tropical como o nosso, é tentar interpretá-los da forma correta e não necessariamente ler neles aquilo que mais nos agrada ou mais serve para a nossa narrativa preferida. Afinal, os índios do “faroeste” podiam estar apenas trocando receitas de bisão assado, naqueles sinais.
O primeiro e mais recente dos sinais é o fenômeno Palworld que, numa simplificação marota, não deixa de ser um Pokémon com armas. E isso não é demérito nenhum para o jogo, muito pelo contrário. É de admirar não apenas a coragem do estúdio, como a oportuna junção de elementos comprovadamente eficientes, tais como monstrinhos fofos, cenários deslumbrantes e pancadaria com armas poderosas. Sem contar o risco de receber processos a torto e a direito, por cópia de conceitos ou patentes.
Segundo o fabricante, mais de 8 milhões de downloads foram feitos nos seis primeiros dias do jogo. Se considerarmos que cada um custou R$ 88,99, teremos uma soma de dinheiro tão grande que daria orgasmos múltiplos nessa turma do “tudo por uma taxação”, que habita nossas terras. Enquanto reciclo esses asciis, o Steamspy informa que a base de owners do jogo está entre 20 e 50 milhões e que, neste momento, tem 1,9 milhão de pessoas jogando o jogo. Uau!!!
Independentemente da grana alta e das considerações sobre plágio, sobre o jogo ainda não estar 100% pronto, sobre a credibilidade da empresa etc., o pensamento que deve permear (quase) todo mundo é: poxa, podia ser o meu jogo. E o lance é que podia mesmo.
A internet tem dessas coisas: ela é tão grande, tão presente no mundo, que um resultado desses é possível com uma certa frequência. Obter esse retorno na época da mídia física seria praticamente impossível, num intervalo tão pequeno de tempo.
O truque aqui é entender os gatilhos que dispararam esse fenômeno de aceitação e vendas. A gente pode ficar meses e meses chutando possibilidades e provavelmente nunca acharemos a resposta certa. Se alguém disse que a tem, está mentindo. Mesmo sendo os donos do jogo. O barato então não é a chave decodificadora, mas o processo de se tentar chegar a ela. Essa informação pode ser útil para produções mais à frente mas não caia na armadilha de achar que, se fizer um jogo igual, o resultado será o mesmo.
O segundo sinal trata do tamanho das demissões que estão rolando no mercado de jogos. E pra ser mais exato, elas estão ocorrendo em toda a área de tecnologia. Uns culpam o efeito retardado da pandemia, outros a inteligência artificial e uma pequena minoria culpa os executivos malvadões que, quanto mais faturam, mais se divertem demitindo funcionários.
Mas o que realmente um sinal deste está nos dizendo? É simples: as coisas não são tão maravilhosas, no mercado de games, quanto boa parte da mídia pseudo influenciadora está tentando nos fazer acreditar, desde que inventaram aquele mote do faturamento maior que o do cinema. A fumaça está a nos dizer que alguns foram com muita sede ao pote e uma boa parte deles vai mesmo virar fumaça, independentemente do tamanho da indignação de outros.
O fato em si mesmo não é nem bom e nem ruim. É apenas uma característica funcional da moderna economia que se lastreia numa abrangência global: é tudo formatado de tamanho grande, até mesmo o tombo.
“E eu com isso?”, deveria estar pensando agora o caro leitor. Pois é, tirando o mi mi mi de praxe, sobra muito pouco pra gente tecer considerações conclusivas. Mas não deixa de ser divertido ler sobre o assunto (ou assuntos), partindo de pontos de vista diferentes. Alguma coisa a gente sempre aproveita.
Então, se quiser criticar, elogiar, xingar, falar palavras de incentivo, mandar pix pra ajudar na aposentadoria etc., o canal mais eficiente é o velho e surrado e-mail: renato@tilt.net. Sinta-se livre pra descer o sarrafo porque nesta altura do campeonato, meu amigo, eu já sofri todas as críticas positivas e negativas que um gamedev pode sofrer.
Game Designer formado em Desenho Industrial e Comunicação Visual, em 1981 pela PUC/RJ. Foi diretor técnico e editor da revista Micro Sistemas de 1983 até 1995. Produtor do site TILT online desde 1996. Autor de vários jogos para computador, tais como Amazônia, Serra Pelada, Aeroporto 83, Angra-I, Xingu, Resgate na Serra do Roncador, Pedra Negra, e muitos outros. Criador das ferramentas de produção e programação de jogos: Sistema Editor de Adventures, Zeus, Micro Aventuras e Projeto Gênesis.