Pong é sem dúvida o marco inicial da indústria dos games eletrônicos, que mais tarde se tornariam os games digitais como a gente os conhece hoje. Segundo consta, ele foi criado por Allan Alcom como um exercício de treinamento (guarde este detalhe), atribuído a ele pelo fundador da Atari Nolan Bushnell. O resto é história.
Conheci o Pong original (aquela máquina enorme, destinada aos fliperamas) na metade dos anos 70. Nem tinha 18 anos ainda mas já era frequentador assíduo de uma dessas lojas, onde deixava todos os trocados que porventura tivesse nos bolsos. Em meio a todo tipo de máquina eletro eletrônica, ver um jogo ser executado numa tela de televisão deixava qualquer adolescente da época deslumbrado.
Mas o grande barato foi ver o Pong, e seu primo mais simplório o Paredão, saírem das lojas de fliperama e irem parar dentro das nossas casas, através do famoso Telejogo. Isso por volta de 1977. Estava então inaugurada a era dos consoles. Mais alguns anos e o microcomputador pessoal iria entrar para a família e deixar a brincadeira muito mais divertida. Além de jogar, passou a ser possível também criar os jogos.
Pong tem uma estrutura de programação pra lá de simples. Qualquer programador resolve sua mecânica em algumas horas de codificação, não importando a linguagem. Não tem mágica e nem segredos. O que existe de fato é uma oportunidade de aprimoramento, de evolução, de ampliação do conhecimento técnico e principalmente de satisfação de obter um resultado rapidamente. Todo desenvolvedor deveria, um dia, produzir um Pong nem que seja apenas para ele mesmo jogar. É um tremendo exercício de treinamento.
Na verdade, o Pong aqui é só um exemplo. Vale fazer isso com qualquer um dos clássicos do entretenimento, como Jogo da Velha, Batalha Naval, 21 Palitos, Forca e mais um monte deles, cuja mecânica de funcionamento pode ser decodificada em algumas horas. E pra que isso?
Entenda o seguinte: por mais sofisticados que os jogos atuais sejam, por mais maravilhosas que sejam as imagens e os sons, por mais criativa que seja a narrativa, na essência podemos sintetizar cada um deles em alguns modelos básicos, ou seja, no final das contas ou o jogo é atire e corra, ou corra pulando obstáculos entre plataformas, ou deslize por uma pista delimitada, ou colete objetos ou simplesmente lute com um oponente.
Essas mecânicas clássicas existem por uma razão simples: elas funcionam bem como diversão e a função do desenvolvedor é não estragar aquilo que já é consagrado. Não se trata de não inventar algo novo, mas apenas de mostrar que sabe usar papel e lápis antes de jogar tinta à óleo numa tela em branco, sem nunca ter colocado as mãos num pincel.
Além disso, desse exercício pode surgir alguma produção que acabe ganhando um espaço especial no gosto das pessoas. Então, se estiver naquele ponto do seu jogo, onde começa a ficar difícil resolver as questões que você mesmo planejou para ele, dá uma parada, programe um Pong (ou qualquer outro dos clássicos) e quando retornar ao seu projeto, verá que as coisas podem estar mais claras do que antes.
Fiz isso inúmeras vezes e a grande maioria delas ficou apenas no exercício. Mas algumas viram a luz do mercado e até tiveram destaque nele. Talvez o mais notório seja o Aeroporto 83, que nos anos 80 serviu como um dos primeiros games no Brasil feito 100% em linguagem de máquina (assembler) e publicado numa revista de informática, com o propósito de compartilhar a estrutura de construção do jogo com os leitores. Nos anos 90 ele foi remodelado com mais recursos e efeitos, também publicado para compartilhar técnicas de construção para Windows e Delphi.
Para dar uma olhada (e jogar) o link é este: tilt.net/aeroporto.
Além de prover entretenimento por algum tempo, esse tipo de produção tem um outro propósito: compartilhar técnicas de construção e desenvolvimento de games, podendo assim ser classificado como game editorial. Como nos mostra o caso do Pong, um baita resultado para um mero exercício.
Então, se quiser criticar, elogiar, xingar, falar palavras de incentivo, mandar pix pra ajudar na aposentadoria, etc, o canal mais eficiente é o velho e surrado e-mail: renato@tilt.net. Sinta-se livre pra descer o sarrafo porque nesta altura do campeonato, meu amigo, eu já sofri todas as críticas positivas e negativas que um gamedev pode sofrer.
Imagem: equipe Quebrando o Controle
Game Designer formado em Desenho Industrial e Comunicação Visual, em 1981 pela PUC/RJ. Foi diretor técnico e editor da revista Micro Sistemas de 1983 até 1995. Produtor do site TILT online desde 1996. Autor de vários jogos para computador, tais como Amazônia, Serra Pelada, Aeroporto 83, Angra-I, Xingu, Resgate na Serra do Roncador, Pedra Negra, e muitos outros. Criador das ferramentas de produção e programação de jogos: Sistema Editor de Adventures, Zeus, Micro Aventuras e Projeto Gênesis.