Finalmente a Avenida Indie da BGS recebeu o que tanto foi pedido nos anos anteriores: espaço para circular. Não mais aquela ruazinha estreita, quase como um beco bucólico, espremida entre colunas. O visitante teve espaço de sobra para ver e principalmente “juntar” gente na frente dos minúsculos estandes. Mas em contrapartida, ela perdeu totalmente a sua identidade, quer pela disposição não mais linear, quer pela presença de, digamos, corpos estranhos ao que normalmente se entende por “iniciantes na produção de games, com pouca grana”.
A mudança da BGS para um endereço mais moderno e principalmente mais amplo gerou essa sensação de espaço generoso para circulação e mesmo em momentos mais intensos, houve facilidade de locomoção. Dessa vez faltou (e muito) uma sinalização eficiente. A avenida indie, por exemplo, só foi marcada por uma plaquinha quase no teto do pavilhão, indicando sua “entrada”. Estranhamente, de longe parecia que ela tinha um portal fartamente iluminado (o que seria uma excelente ideia) mas na verdade era o estande do Senac.
Assim como nas outras áreas da feira, que ganharam nomes sugestivos como BGS talk, BGS busines, BGS conference, etc, a antiga avenida recebeu o nome de BGS indie. Não teve um indicador de “área” ou “espaço”. Pior que isso, sem mapa na entrada, sem totem, sem nem mesmo um flyer e com um aplicativo de celular simplório, a resposta para a pergunta mais óbvia “onde fica o pessoal indie?” caiu no vazio, literalmente. Aliás, a falta de um sistema de endereços ainda que rudimentar, dificultou bastante a localização precisa de algum jogo em especial que se quisesse ver e/ou prestigiar.
Nenhum evento de grande porte pode abrir mão de uma sinalização eficiente dos espaços, ainda que não esteja estruturado no tradicional modelo de ruas ou corredores. Ações de marketing, que antecedem o momento da explosão de visitantes, ficam sem poder incluir nas suas peças “visitem-nos no endereço tal”. Sinal dos tempos: economizaram até na faixa que suporta a credencial, sem um patrocinador específico, sendo apenas um cordãozinho.
Mas, e os jogos indies? Pois é, onde foram parar os jogos indies, já que nesta BGS dava pra contar nos dedos a quantidade deles? Não estavam lá e isso ficou bem claro. A grande maioria dos retrogames indies migraram para eventos mais nichados e consequentemente mais “baratos” para expor. Outro tanto de indies modernos mudaram para eventos que estão se consolidando (com mais atenção e prestígio aos indies) como o BIG/Gamescom ou mesmo a Retrocon. Sinal dos tempos ou sinal de uma economia restritiva, onde preços altos para estandes minúsculos assustam muito, principalmente quem tem juízo.
Na verdade é disso que se trata esta postagem: “ir ou levar para um evento o seu projeto de jogo”. É uma aposta quase cega em um mercado grande, porém ingrato. Um mercado onde os resultados podem aparecer da noite para o dia ou nem dar as caras, mesmo depois de anos. A Steam está lotada de exemplos assim. Os eventos, enquanto locais de venda e não apenas para marcar presença, ainda estão devendo esse resultado de forma mais intensa.
Os poucos jogos que foram apresentados estão num patamar muito bom, tanto em qualidade visual quanto em jogabilidade. E não teve apenas indies iniciantes mas indies experientes, já calejados por outros carnavais, alguns dos quais já estiveram no pavilhão central em outros anos. E é justamente essa mescla que faz (ou fazia) a glória do agora BGS indie. Pena que não há um tratamento mais dedicado por parte dos organizadores, que lhe dê um “ar” de área das novidades e local de encontro do povo maluquinho que faz games por essas terras.
Quem se aventurou pelo BGS indie pode ver que tem muito “mais do mesmo”, mas isso não é um ponto negativo, pelo contrário. Mostra uma certa consistência em nossa indústria, até porque inovar realmente não é assim, todo dia, que acontece. Mas é preciso dar uma chance (boa) aos modelos experimentais.
Outra curiosidade foi a percepção de que muitos visitantes estrangeiros estavam circulando curiosos pelo local. Gente falando em inglês, espanhol e até mesmo em japonês. Deixo aqui uma pequena reflexão: não era esse o momento oportuno para mostrar exemplos da nossa cultura, da nossa língua e do nosso modo de ver o mundo?
Bacana também foi ver uma boa parte dos devs indies, presentes como expositores, expondo suas experiências no palco BGS talks. Mesmo no tumulto de sons e na correria do tempo exíguo, dicas valiosíssimas foram distribuídas pelos palestrantes.
Por mais que não soe estranho, para alguns um estande de colégio, no meio dos indies, essa diversidade não deveria existir pois ela quebra o sentido de local onde estão os jogos da garotada que tenta entrar neste mercado. Ainda que muitas coisas impeçam que o indie de hoje seja amanhã a grande franquia na área central do evento, essa é uma possibilidade que nunca deve ser descartada.
Se está sobrando espaço não vendido, porque não colocar no meio dos indies um mini palco para uma aproximação maior dos produtores com o público consumidor? Promover mais essa integração das comunidades que se esforçam para produzir algo interessante? Tornar o espaço indie algo realmente desejável de investimento, pelo seu diferencial. Onde estavam os cursos de formação e pós graduação em produção de games? As entidades e associações de classe? Os projetos representativos de uma gente que sabe fazer cultura? Uma jam (por que não?). Ser indie é antes de tudo se lançar ao mercado, sem medo de ser feliz, e toda ajuda é sempre bem vinda, principalmente aquela que mostra caminhos, indica direções e aposta na criatividade daqueles que ainda não se decepcionaram com o mercado.
Minha presença na BGS sempre foi no sentido de ir no evento para entender o momento comercial, bisbilhotar as possibilidades e tendências do mundo indie, no sentido de identificar possibilidades de exploração da visibilidade e oportunidades de negócios. Talvez esta seja minha última participação na BGS, como olheiro do panorama indie br.
Concordo com alguns expositores com quem conversei lá: chegou a hora de “investir” mais em eventos focados realmente na cultura indie.
Game Designer formado em Desenho Industrial e Comunicação Visual, em 1981 pela PUC/RJ. Foi diretor técnico e editor da revista Micro Sistemas de 1983 até 1995. Produtor do site TILT online desde 1996. Autor de vários jogos para computador, tais como Amazônia, Serra Pelada, Aeroporto 83, Angra-I, Xingu, Resgate na Serra do Roncador, Pedra Negra, e muitos outros. Criador das ferramentas de produção e programação de jogos: Sistema Editor de Adventures, Zeus, Micro Aventuras e Projeto Gênesis.