Depois de uma certa idade, é normal que a gente passe a comparar os tempos atuais com tempos mais distantes e é quase inevitável a clássica declaração “bom era antigamente”, ainda que esse antigamente se refira a poucos anos atrás. Isso é normal nos adultos apenas porque os jovens, em idade de descobrimentos, ainda não viveram o suficiente para ter bagagem comparativa.
Saudosistas de um tempo que já passou têm dificuldade em entender que a evolução, seja ela natural ou tecnológica, impõe a regra da adaptabilidade a todos. Então, não adianta chorar pelo leite derramado, pois as boas lembranças não passam disso: lembranças.
No mundo dos jogos já faz um tempo que está na moda falar que os jogos antigos eram muito mais divertidos do que os jogos atuais, como se a evolução tecnológica tanto da programação quanto dos equipamentos nada somasse ao produto final. O componente saudosista, embora não possa ser desprezado nunca, torna-se cada vez mais um nicho, dentro de outros nichos.
Esse fenômeno também já pode ser visualizado no eterno embate entre as redes sociais, que substituíram com larga vantagem os meios tradicionais de divulgação dos nossos próprios games. Chega a ser assustador ouvir ou ler influencers decretando o fim dessa ou daquela rede, apenas porque nelas um post seu não retorna mais milhares de engajamentos orgânicos. Tem gente jurando de pé junto que no tempo do Orkut era bem melhor.
As redes sociais, assim como os games, evoluíram e continuam evoluindo e nossa melhor forma de participar desse processo é entender e se adaptar a elas. Para compreender esse processo com alguma chance de acertar, devemos observar os três principais filtros pelos quais nossas produções devem passar: sejam elas games ou posts dos nossos games nas rede sociais.
Filtro 1: ONDE. É importante saber onde estão as maiores atenções, tanto em razão da relevância quanto da quantidade de engajados. Você pode não gostar da loja tal, ou da rede tal mas a sua preferência pessoal é irrelevante. Não declare a morte de um estilo de game ou de uma rede apenas porque você não gosta dele/dela.
Filtro 2: COMO. É importante apresentar-se ou apresentar o seu produto em perfeita sincronia com o público almejado. Se as pessoas gostam do estilo do seu trabalho, com certeza estarão mais propensas a consumi-lo. Se você descreve algo em sânscrito, vai ter baixa repercussão porque poucas pessoas entendem esse idioma. Mas se quer assim mesmo fazê-lo, então não adianta postar numa rede onde impera as tretas entre personalidades famosas. Nem o post e nem o game serão relevantes lá.
Filtro 3: VISÃO. É importante conhecer como os consumidores da sua comunicação entendem o seu posicionamento e as suas pretensões. Aceite, de uma vez por todas, que cada um “vê” a sua construção de uma forma diferente, então, todo o esforço para simplificar a mensagem será sempre bem-vindo. As pessoas de um modo geral não são burras, mas todo mundo tem cada vez menos tempo para se dedicar à interpretação de uma comunicação mais rebuscada.
Não é preciso militar na corrente do shocking, para ter a atenção capturada do maior número de pessoas. As vezes, basta não ser repetitivo ou julgar que todo mundo precisa ter o mesmo gosto pessoal ou a mesma compreensão do mundo. Falar para o mundo que está perto pode dar muito mais resultados do que falar para quem está do outro lado do planeta.
Mas afinal por que razão misturei dois assuntos distintos? Pela simples razão de que a cada dia que passa os games intermediários, ou indies como preferirem, tornam-se mais parecidos organicamente a posts nas redes. Isso é evidenciado pela grande produção de jogos br e pela baixa repercussão deles nas redes, já que os sites de games propriamente ditos não dão conta do recado.
Se dominar a técnica envolvida na comunicação em um deles (posts simples), pode por tabela dominar a do outro (posts dos seus jogos). Menos esforços e mais resultados, desde que não se pretenda surfar gratuitamente nas ondas alheias, afinal não existe almoço grátis.
Então, se quiser criticar, elogiar, xingar, falar palavras de incentivo, mandar pix pra ajudar na aposentadoria, etc, o canal mais eficiente é o velho e surrado e-mail: renato@tilt.net. Sinta-se livre pra descer o sarrafo porque nesta altura do campeonato, meu amigo, eu já sofri todas as críticas positivas e negativas que um gamedev pode sofrer.
Imagem: reprodução de The Gossips, de Norman Rockwell [1948]
Game Designer formado em Desenho Industrial e Comunicação Visual, em 1981 pela PUC/RJ. Foi diretor técnico e editor da revista Micro Sistemas de 1983 até 1995. Produtor do site TILT online desde 1996. Autor de vários jogos para computador, tais como Amazônia, Serra Pelada, Aeroporto 83, Angra-I, Xingu, Resgate na Serra do Roncador, Pedra Negra, e muitos outros. Criador das ferramentas de produção e programação de jogos: Sistema Editor de Adventures, Zeus, Micro Aventuras e Projeto Gênesis.