Por Um Punhado De Bits: Eleição Dá Jogo?

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No exato momento em que você está lendo esta coluna, as votações de primeiro turno já se encerraram e o vencedor da sua cidade deve ter sido anunciado com foguetes e carreatas. Ou então tudo voltou ao zero, por conta do segundo turno.

Portanto temos alguns poucos dias de calmaria (?) para levantar alguns pontos interessantes, já que essa eleição para prefeito foi bem diferentona. Sem contar que agora entramos em rota para 2026, quando um novo presidente será escolhido para conduzir o barco pela tormenta, isso se aquele sujeito desprovido capilarmente no topo não decretar de fato uma nova dita e dura.

Mas antes de começar a listar os pontos para detonar a extrema direita ou a estrema esquerda, e antes de tomar partido, vale considerar que não estamos falando aqui de política partidária. Não vamos demonizar ninguém e menos ainda beatificar figurinhas que já deveriam ter sido aposentadas das ruas (ou das urnas).

Foque apenas nos mecanismos, nos atos e fatos e comecemos por aí. Neste momento, partidarizar um game, ainda que se enxergue nele uma crítica, é o caminho mais curto para o fracasso e para o limbo dos projetos irrelevantes (vide os que tentaram recentemente). Nenhum outro tipo de estrutura flopa tanto quanto o partidarismo explícito e tendencioso, que é mais ácido e corrosivo que a lacrate propriamente dita. Mas, no fundo, todos nós ainda queremos dar aquela alfinetada nos nossos desafetos e isso é inevitável. Mas lembre-se: mantenha a classe, a sagacidade, a sutileza e principalmente as entrelinhas.

Tomemos um exemplo já clássico dessas eleições: a cadeirada. Não importa aqui quem desferiu o golpe, contra quem, com quais argumentos, etc. O fato em si é que nunca antes na história das eleições deste país, um concorrente agrediu outro com um instrumento potencialmente letal e não saiu do cenário algemado, diretamente para uma audiência de custódia. Sei que isso depõe (e muito) contra as nossas instituições e o que está feito, feito está.

O ponto que importa é utilizar esse acontecimento como parte de uma narrativa a qual, por si só, já embute um monte de variantes: a cadeira acerta e mata (ou aleija) o oponente, o oponente desvia e revida o ataque, ambos ou um deles sai de cena preso pela polícia, nada acontece (como de fato nada aconteceu) mas ainda assim inúmeras repercussões se apresentarão pelo game dali em diante.

Percebeu a diferença entre ficar na simples militância pró ou contra ou utilizar um acontecimento real, visto por tantos quantos os cortes da internet permitiram e, a despeito do bloqueio do X, interagir com ele? Até então, uma cadeirada entre debatedores, num jogo, nada mais seria que um momento caricato, quase impossível de acontecer, só que não. Aconteceu de fato.

Falando numa linguagem de game designer, o uso militante do fato apenas atinge e beneficia o lado que achou que foi tudo ok com a agressão. Já o uso da estrutura, sem um alvo de cor partidária específica, permite ao jogador a vivência alternada, o que pode agradar a muito mais gente. O jogador então pode ser o agressor ou o agredido, dependendo das suas opções dentro da narrativa.

Essa é toda a beleza das possibilidades interativas de um jogo e se contrapõe ao replicar ad nauseam de um determinado acontecimento. Se aplicarmos essa base estrutural, podemos já ir trabalhando num game para quando vier, em breve, a mãe de todas as eleições.

Sei que é tentador ficar espezinhando um perdedor (ou alguém que queremos entender como perdedor) mas você deve optar por isso ou por um game longevo que sobreponha a datação dos eventos, perdurando por tantas e quantas eleições vierem a acontecer. Até porque, em política vale a máxima: nada como um dia após o outro.

Pense por um instante em tudo que rolou nesses dias e que se encaixariam naquele seu game bacanudo sobre escolhas políticas: socos, documentos falsos, ameaças, fake news, apelidos, reviravoltas e mais um monte de coisas. Teve até um juiz falando em “caçar um eleito” antes mesmo de saber se o dito cujo seria de fato eleito. Puro suco de brazuela e, se bobearmos, a iniciativa das grandes narrativas interativas estará nas mãos dos políticos e não dos game designers. Perderemos a condução das mecânicas inovadoras, tanto quanto os humoristas perderam as deles, num passado não muito distante, e os jornalistas perderam também, nessa última corrida eleitoral.

Então, se quiser criticar, elogiar, xingar, falar palavras de incentivo, mandar pix pra ajudar na aposentadoria, etc, o canal mais eficiente é o velho e surrado e-mail: renato@tilt.net. Sinta-se livre pra descer o sarrafo porque nesta altura do campeonato, meu amigo, eu já sofri todas as críticas positivas e negativas que um gamedev pode sofrer.

Imagem: Microsoft Image Creator